Hoje o intuito da nossa carta é trazer um estudo de caso de economia tributária no planejamento sucessório, mostrando ferramentas tanto jurídicas quanto financeiras para a família.
Contaremos a história de Ricardo e Débora (nomes alterados) que são casados e possuem uma filha pequena, de 7 anos, a Maria. Construíram ao longo de seus 20 anos de casamento todo seu patrimônio e são casados no Regime de Comunhão Parcial de Bens.
Para fins de contextualização: o Regime de Comunhão Parcial de Bens define que todo o patrimônio construído desde que o casal se une é considerado bem comum, ou seja, são coproprietários dos bens. Isso traz o conceito de meação, onde numa eventual morte de um dos cônjuges, o outro tem direito à metade (daí o nome) sem custos de ITCMD. A outra parte do patrimônio é considerada a legítima e disponível. O gráfico abaixo ajuda a ilustrar melhor:
A reserva disponível pode ser destinada para qualquer pessoa ou instituição, sob a condição de existir um testamento destinando para tal. Caso contrário, essa parcela destinar-se-á também aos herdeiros necessários.
Falando em testamento, acaba por se tornar um instrumento poderoso para definir eventuais curadores responsáveis por filhos menores ou incapazes, criando uma contingência importante para o planejamento patrimonial.
Diante do cenário, a ideia do estudo realizado foi mapear como estava a proporção entre bens imobilizados e financeiros, e a liquidez que seria gerada em caso do falecimento de um dos cônjuges.
A tabela abaixo ilustra como estava a proporção entre cada um:
Bem |
Tipo |
UF |
Observação |
Declarado por? |
Valor de venda |
Comum/particular |
Casa |
Residencial |
SP |
Uso Próprio |
Ricardo/Débora |
R$ 4.700.000,00 |
Comum |
Apartamento |
Residencial |
SP |
Uso Próprio |
Ricardo/Débora |
R$ 2.500.000,00 |
Comum |
Aplicações financeiras |
– |
– |
Recurso Comum |
Ricardo |
R$ 9.337.000,00 |
Comum |
Aplicações financeiras |
– |
– |
Recurso Comum |
Débora |
R$ 4.156.220,00 |
Comum |
|
|
|
TOTAL: |
R$ 20.693.220,00 |
|
Diante do exposto, a análise pensada foi avaliar qual era a base de cálculo inventariável, sabendo que a meação de um dos cônjuges não entra. Além disso, a carteira de investimentos não possuía investimentos em previdência, que sob certas condições, ainda pode ser considerado um investimento que não entra no rol de cobrança do ITCMD – principalmente a modalidade VGBL. A análise foi feita avaliando os custos entre Cartório, ITCMD no Estado de SP e com honorários advocatícios:
Base de Cálculo (Em R$ mil) |
||
Descrição |
Alíquota |
Valores |
Valor total dos bens |
– |
20.693 |
Meação |
– |
– (10.346) |
Patrimônio Inventariável |
– |
10.346 |
ITCM |
4% |
413 |
RI/Cartório |
1% |
103 |
Honorários Advocatícios |
6% |
620 |
Impacto financeiro atual |
– |
1.136 |
Alguns pontos de atenção:
- Os honorários advocatícios podem ser substancialmente menores ou inexistentes em caso de inventário extrajudicial. Entretanto, em caso de filhos menores ou incapazes, o inventário judicial é obrigatório;
- As alíquotas em SP e em outros Estados estão se adequando à progressividade e ao teto ainda estipulado pelo Senado em 8% (que está em vias de ser majorado).
A proposta, que visa também alterar o art. 16, da lei 10.705, de 28/12/00, pretende adequar as alíquotas do ITCMD ao valor dos bens transmitidos, de forma escalonada, o que pode impactar significativamente o planejamento sucessório e a tributação de doações e heranças a partir do ano de 2025. Caso o PL 7/24 seja aprovado com a sua redação original, a atual cobrança fixa do ITCMD, de 4%, passará a ser progressiva, com alíquotas que poderão variar de 2% a 8% sobre o valor da herança ou doação, conforme se demonstra a seguir:
- Para valores de até 10.000 UFESPs (até R$ 353.600,00): aplicação da alíquota de 2%;
- Valores entre 10.000 e 85.000 UFESPs (de R$ 353.600,00 a R$ 3.005.600,00): aplicação da alíquota de 4%;
- Valores de 85.000 a 280.000 UFESPs (R$ 3.005.600,00 a R$ 9.900.800,00): aplicação da alíquota de 6%; e
- Valores acima de 280.000 UFESPs (acima de R$ 9.900.800,00): aplicação da alíquota de 8%.
Fonte: Migalhas
Considerando o cenário atual, ainda assim, o impacto financeiro estaria em torno de R$ 1,136 milhão. Dependendo do Estado, as alíquotas para doação em vida são mais vantajosas, mas não é o caso para SP. A doação poderia ser eventualmente útil para travar as alíquotas atuais; mesmo assim, para o caso do estudo de caso, passar agora para Maria com a idade muito precoce não parecia a melhor solução.
Utilizamos, então, três estratégias poderosas para diminuir a base de cálculo e criar melhor liquidez para a sucessão da família:
Investimentos em Offshore:
A estrutura Offshore em países com tributação privilegiada, bem como estrutura de Trusts, conseguem contornar o pagamento de imposto de sucessão no Brasil. Além disso, melhoram a governança familiar e a forma de distribuir o patrimônio.
Previdência Privada, VGBL:
Tivemos momentos turbulentos sobre a possibilidade de cobrança ou não do imposto de transmissão para a previdência privada. Isso foi afastado em Dez/24 pelo STF. A única ressalva ficou para os casos de quem transfere todos os ativos para previdência na iminência da morte do titular, por ser configurado abuso no planejamento fiscal.
Apólice de Seguro de Vida:
A apólice de seguro é uma ferramenta poderosa, dentro de um contexto de idade, condições de saúde, entre outros fatores, para alavancar o patrimônio da família. Também possui segurança jurídica por proporcionar um valor inalienável e impenhorável. A liquidez gerada é praticamente instantânea e ajuda principalmente famílias que possuem pouca liquidez financeira, isto é, muitos ativos imobilizados.
Ricardo e Débora são um casal jovem. Possuem cerca de 40 anos. Possuem horizonte de tempo considerável para os investimentos. Dessa forma, destinamos no nosso projeto cerca de 20% (R$ 2,7MM) dos recursos financeiros para offshore, e cerca de 10% (R$ 1,3 MM) para Previdência Privada. Além disso, consideramos uma apólice com indenização de R$ 1 milhão. O ponto alto é que para acessar uma indenização desse montante, o valor a ser desembolsado será de R$ 50 mil reais anuais por 10 anos (total pago de R$ 500 mil). Ou seja, desde o primeiro pagamento, a família já possui acesso ao valor projetado. Isso traz uma alavancagem financeira considerável.
Dessa forma, nossa tabela fica da seguinte forma:
Base de Cálculo (Em R$ mil) |
||
Descrição |
Alíquota |
Valores |
Valor total dos bens |
– |
20.693 |
Meação |
– |
-(10.346) |
Previdência |
– |
-(1.349) |
Offshore |
– |
-(2.699) |
Patrimônio Inventariável |
– |
6.299 |
ITCM |
4% |
252 |
RI/Cartório |
1% |
63 |
Honorários Advocatícios |
6% |
378 |
Impacto financeiro sugerido |
– |
693 |
Impacto financeiro atual |
– |
1.136 |
Economia gerada |
– |
443 |
Uso da apólice de R$ 1MM (pagos R$ 500 mil) |
– |
500 |
Economia Extra gerada (impacto sugerido – apólice) |
– |
193 |
Economia total |
– |
636 |
Explicando a tabela: ao utilizar a previdência e Offshore, diminuímos a base de cálculo de 10.346 para 6.299 milhões. Nessa toada, já teríamos uma redução de impacto de 1,136 milhão para 693 mil reais. Uma economia de 443 mil reais.
Além disso, trouxemos a estrutura de apólice de seguro, com a qual Ricardo e Débora desembolsarão cerca de 500 mil reais para ter acesso a uma indenização de 1 milhão. Logo, com 500 mil reais destinados a essa ferramenta, já conseguimos cobrir o impacto atual e deixamos certa margem pensando nas futuras majorações de alíquotas que podem ocorrer nos próximos anos. Ou seja, de 500 mil reais para 693 mil reais, temos uma economia extra de 193 mil reais.
Somando os 193 mil com a primeira economia de 443 mil reais, temos uma economia total de 636 mil reais. Comparado ao primeiro valor, temos uma economia em mais de 50%.
O foco principal da AMB é na gestão de investimentos no Brasil e Exterior. Entretanto, o planejamento sucessório faz parte do nosso escopo, trazendo outros profissionais como advogados para implementação do projeto.